Embora a implementação de ambientes participativos por organizações seja direcionada pela preocupação com o retorno sobre o investimento (ROI) e pelas metas dos departamentos de marketing, aumenta cada dia mais a percepção de que os clientes devem ter voz ativa na criação e no aperfeiçoamento dos produtos digitais. Ambientes de criação compartilhada de conteúdo online, como mídias sociais, naturalizam esta perspectiva.

Pesquisa do Content Marketing Institute em 2014, mostrou que 90% das empresas (B2C) nos EUA faziam marketing de conteúdo (86% em 2013). No entanto, apenas 39% dos marqueteiros possuíam estratégia de conteúdo articulada. E apesar do conteúdo ser o principal componente das campanhas, 55% acreditavam que não eram eficazes. (4, PDF)

Outra pesquisa, a TIC Empresas 2019, divulgada pelo Cetic.br em abril de 2020, mostra que muitas empresas estão deixando de lado os sites institucionais e preferindo usar redes sociais como principal canal de contato e negócios de pequenas, médias e grandes empresas no Brasil. Embora os sites sejam usados por 54% das PMEs, a presença redes sociais chega a 78%. Entre as empresas com websites, a maioria é estática, não conversa com os clientes. Redes como Facebook ou Google+ são usadas por 62% das PMEs, mais que os 59% medidos em 2017. Também cresceu o uso de aplicativos de mensagens como Whatsapp ou Telegram, de 42% para 54%. Dobrou o uso de redes sociais de imagens, como Instagram, Flickr ou Snapchat, de 22%, em 2017, para 44%. Contrastando com os números de websites, as plataformas oferecem experiência de uso mais fácil. (Convergência Digital, Acesso em 8.5.20)

As mídias participativas permitem que os clientes tenham acesso direto às organizações com as quais se identificam, dando sugestões, fazendo críticas, apresentando ideias, ajudando a criar e aperfeiçoar produtos, criando amizades. Internamente, a responsabilidade por esta interlocução é dividida entre colaboradores que participam do negócio nos canais para a comunicação direta com suas lideranças.

Embora muitas vezes as organizações se preocupem mais com as funcionalidades e recursos técnicos, a eficiência das soluções não é suficiente. Para usar efetivamente essas ferramentas é preciso adaptar a cultura interna a um modelo baseado na transparência e na disposição para enfrentar os aspectos positivos e negativos do diálogo aberto e transparente.

A empresa precisa estar preparada para encarar seus pontos fracos, dialogar com clientes, parceiros, e agir de verdade (e não apenas nas mensagens) a partir das críticas e sugestões que recebe. Precisa incorporar a interlocução direta com o público aos processos internos, superando resistências, alimentando mentalidades colaborativas e sensíveis às demandas e aprendendo com os erros e acertos do dia a dia dos relacionamentos estabelecidos.

Atividades – implementação de mídias sociais em organizações

Definir objetivos e metas preliminares, o que a organização procura com as ações nas redes sociais, mesmo que venham a ser alteradas à medida que a atuação leve ao melhor conhecimento dos canais e do público de um determinado segmento.

O Rappler é um informativo com linha editorial progressista. Uma área participativa do site, a Move.PH, sinaliza que é uma parte dedicada ao engajamento cívico de campanhas estimuladas por conversas e histórias trocadas digitalmente entre pessoas.

Realizar pesquisas dos hábitos e necessidades dos participadores (clientes, colaboradores, gestores, fornecedores, parceiros) de ambientes online (blogs, wikis, comunidades, etc.), para conhecer em detalhe vocabulários, traços demográficos, culturais. O entendimento das motivações do público que procura mídias sociais sobre determinado assunto, bem como de seu ambiente de relacionamentos, é um passo para atender suas expectativas e necessidades, fazer a adaptação aos seus estilos de participação e verificar o quanto os produtos e serviços oferecidos são passíveis de despertar interlocução.

Fazer um planejamento para o uso das ferramentas participativas. O planejamento inclui as principais ações e resultados estruturados da interlocução, canais a explorar, características do público-alvo, líderes de comunidades já existentes que podem ser contatados, o valor a ser criado com as ações, os riscos decorrentes, os custos e recursos necessários, a disponibilidade interna da equipe em diferentes níveis para possíveis mudanças culturais.

Como estes veículos aproximam a organização do público, projetam para dentro sua influência e suas demandas, exigindo respostas à sua participação. Por isto, o planejamento estratégico deve prever, além da entrada de informações, as respostas e ações, que são menos de marketing e relacionamento e mais de compartilhamento, cooperação e de criação coletiva.

Esse planejamento não pode ser detalhado com muita exatidão – ambientes participativos evoluem organicamente e é difícil prever em que sentido. O envolvimento de colaboradores mais jovens com a experiência digital em vários temas e plataformas é natural para eles.

Participar de comunidades e plataformas consolidadas, escolhendo as mais adequadas para a interlocução. Que ferramentas o público usa, em quais se sente confortável, quais não são solicitadas mas podem ser experimentadas?

Blogs já não são tão procurados para a formação de opinião, apesar da euforia inicial. Wikis também não têm sido tão utilizados como na década dos anos 2000. Facebook, LinkedIn e Twitter têm sido procurados para comunicação e compartilhamento de informações com clientes por seu amplo uso, e por facilitarem a criação de redes entre colaboradores e parceiros externos. Os benefícios tendem a aparecer rapidamente, com a melhoria da comunicação interna, o aumento do conhecimento sobre os clientes, as possibilidades de aperfeiçoamento rápido dos produtos em função do retorno recebido, bem como a melhoria dos serviços oferecidos.

É preciso considerar as atividades nas mídias sociais como prioritárias, parte dos produtos e serviço que a organização oferece.

Oferecer desde o início ambientes em que os clientes exponham ideias e opiniões, sem censura ou sanções a críticas. A liberdade de expressão garante a confiança e o respeito dos participantes, estimulando o diálogo e o envolvimento aprofundado entre as partes, o que ajuda a criar uma massa crítica que muitas vezes evita espontaneamente spams, falsas notícias e participações de baixo nível.

A Lego é um exemplo de organização que usa o crowdsourcing nos seus processos de inovação, incentivando colaboração entre as equipes internas de diversas áreas e os clientes.

Em 2008, a Business Innovation Community (BIC), da Daimler, lançou uma estratégia via mídia social para desenvolver novos modelos de negócios, além da fabricação de carros. Foram recebidas 2.000 ideias de 30.000 usuários. E depois de diversos projetos piloto, como novos conceitos de mobilidade (como co-propriedade de carros e gestão de percursos via aplicativos móveis), a empresa investiu no aperfeiçoamento do processo. (2)

As informações publicadas são de posse tanto da organização quanto das pessoas que as publicam, e esse sentido de compartilhamento reforça os laços, bem como a percepção de que cada um é responsável pelo clima do ambiente.

Preparar as equipes internas (de TI, desenvolvimento de produtos, marketing, pesquisa e desenvolvimento, atendimento ao cliente, comunicações internas) para o uso e o impacto das ferramentas nos processos funcionais. As equipes de vendas e de marketing de produtos, especialmente, sabem que as mídias sociais são canais vivos e personalizados de relacionamento, em que é preciso acompanhar e publicar posts, prover retorno, brindar os participantes com informações privilegiadas.

Também profissionais da área de planejamento e desenvolvimento devem ser preparados (especialmente em relação à visão estratégica) para o aperfeiçoamento técnico dos ambientes online, sua usabilidade, funcionalidades e recursos disponíveis na interface.

Outros profissionais envolvidos são as equipes de atendimento e suporte aos clientes, bem como profissionais de gestão de pessoas e advogados, esses últimos para o desenvolvimento de políticas e procedimentos a seguir, bem como para o exame de questões legais que apareçam.

Em troca da sua dedicação, esses profissionais podem se beneficiar da colaboração dos usuários e usar os canais como fonte de novas ideias e tendências e como lugar de experimentação de estratégias de abordagem.

O ideal é impedir que desejos competitivos impeçam colaborações e parcerias entre as pesssoas e equipes, valorizando o “compartilhamento de cérebros”.

Designar responsáveis pela interlocução com o público, pela gestão e pela moderação, bem como pelo preparo da organização para receber as informações que chegam desses canais. Eventualmente outros colaboradores podem ser chamados a responder a interpelações ou a fornecer dados técnicos para tirar dúvidas dos clientes.

O papel desses interlocutores deve garantir o funcionamento auto-organizado das comunidades, valorizar os autores de contribuições importantes, e ao mesmo tempo evitar os abusos, mensagens ofensivas ou sem relação com os assuntos abordados, que afetam o clima e afugentam os participantes amigáveis.

A intermediação bem-sucedida garante que as comunidades criem aos poucos culturas próprias baseadas nos conhecimentos pessoais e nos laços estabelecidos. Mas não se deve querer ter controle sobre todo o conteúdo postado, a escolha de temas amplos e facilita o desenvolvimento de acasos que podem ser de interesse geral do público.

Garantir a consistência da moderação ao longo do tempo, de modo que os participantes conheçam as políticas de publicação e aos poucos estabeleçam comportamentos compatíveis com estes limites. Além de ficar atento ao conteúdo, os moderadores aplicam nos ambientes virtuais procedimentos dos ambientes presenciais, como reforçar as lideranças naturais, criar subgrupos de trabalho quando aparecem novos temas relevantes derivados de temas principais, recompensar os participantes mais ativos e produtivos.

Garantir a constância das atividades dos veículos, atraindo participantes, facilitando sua participação e seu retorno, criando links entre canais e comunidades. É importante que as funcionalidades sejam aperfeiçoadas de acordo com as novas demandas. E que eventos ou atividades complementares possam ser estimulados.

Estabelecer métricas para o modelo de participação escolhido. Alguns indicadores são mais subjetivos e difíceis de medir, como a presença de lideranças ativas e reconhecidas, o aumento da satisfação dos clientes, a diminuição de emails e chamadas de suporte. Também é difícil medir a aquisição de conhecimento pelos colaboradores a partir da troca de informações e ideias, bem como até que ponto esta interlocução influencia o controle de qualidade e a diminuição do tempo de aperfeiçoamento de produtos e seu lançamento no mercado.

Há também indicadores objetivos, como o número de posts publicados, de comentários aos posts, o número de curtidas, o número de visitantes únicos (usuários que usam a plataforma como referência), a variação dos custos de publicidade, entre outros.

Alguns dados de outubro de 2007 das comunidades da Dell mesmo hoje ainda valem o registro:

No começo do programa, em 2005, 49% dos posts eram negativos. Em 2007, momento da pesquisa, apenas 22% eram negativos.

O blog Direct2Dell (sobre produtos, serviços e clientes), com 5 milhões de visitas únicas diárias, estava entre os primeiros 700 no ranking da Technorati, sobre os principais blogs corporativos.

Mais de 7.000 ideias haviam sido enviadas através do IdeaStorm, espaço dedicado à criação e ao amadurecimento de sugestões sobre produtos. Qualquer usuário podia oferecer uma ideia, “promovê-la” fazer comentários ou votar nelas. A Dell designou três funcionários que se dedicavam à gestão da interação com o público no site.

O Studio Dell, interface que agregava as ferramentas participativas da organização, tinha 200.000 visualizações mensais. (1)

Planejar a política interna sobre os direitos de autoria do conteúdo criado pelos usuários, para garantir a proteção contra perdas potenciais. Conversas com advogados de propriedade intelectual e a publicação das advertências adequadas, atribuição de direitos e acordos de confidencialidade evitam problemas futuros.

Rever periodicamente o planejamento, para avaliar a adaptação da organização às culturas dos canais (e vice-versa), ao crescimento caótico (ou orgânico), aos novos rumos e às demandas a partir dos relacionamentos e processos participativos.

Pode-se por exemplo descobrir que um determinado segmento se sente mais confortável em uma rede social do que em um fórum de discussão, e nesse caso é preciso prover os canais necessários.

Os resultados das ações relacionadas a mídias sociais estão diretamente relacionados à participação dos usuários dos canais, em detrimento das exigências, requisitos e aspectos culturais das organizações participantes. Nesses ambientes fica bem evidente a fatia de poder do público na escala de valor comercial e relacional.

(Publicado em 17.8.2008. Atualizado em 8.5.2020)

 

Referências

2) The evolution of social technologiesMartin Harrysson, Detlef Schoder e Asin Tavakoli (McKinsey Quarterly, acesso em 8.4.2017)

4) Content Marketing 2014 – Benchmarks, Budgets, 2014and Trends–North America – PDF (Content Marketing Institute, acesso em 17.1.2015)

1) Dell’s incredible turnaround (Now is gone, acesso em 16.8.2008, não mais disponível)

Livro: Designing social interfaces – principles, patterns and practices for improving the user experience, de Christian Crumlish. Yahoo Press, 2009

Ferramentas de acompanhamento do ranking de empresas em mídias sociais

Free social media monitoring tools, de Rob Gonda (Take me your leader, acesso em 13.3.2010)

Free social media monitoring techniques, de Rob Gonda (Take me your leader, acesso em 13.3.2010)

Hootsuite, ferramentas gratuitas de monitoramento de marcas em mídias sociais (acesso em 13.3.2010)