O design centrado na atividade não é criado em torno dos processos subjetivos, preferências e demandas pessoais dos usuários, mas em torno da realização de ações e objetivos. É indicado para o projeto de processos complexos ou para o desenvolvimento de produtos com amplas possibilidades de uso e público heterogêneo.

Este modelo se baseia em atividades que decorrem de motivações ou objetivos diversos e condicionam os produtos usados pelos usuários. Estas atividades compõem sistemas, em que múltiplas ações são realizadas para alcançar determinados objetivos. Cada ação é realizada a partir de uma proposição e pode ser subdividida em múltiplas outras.

Um sistema de atividades consiste de cada atividade em si, de ações e de operações, bem como do relacionamento entre sujeitos e ferramentas que estes utilizam (Kari Kuutti, 1996; Kaptelinin, Nardi, & Macaulav, 1999).

Por exemplo, a atividade “ir ao Centro para uma reunião”, que tem como motivação chegar ao lugar onde uma reunião vai acontecer, pode ser subdivida em diversas decisões e ações, ou tarefas, como: confirmar o local e a hora do encontro, selecionar uma roupa adequada, anotar o endereço em um bloco de notas, entrar em um carro, dirigir o carro ou entrar em um ônibus e esperar o veículo chegar a seu destino. No veículo, uma série de operações mais ou menos conscientes podem ser realizadas, como sentar no assento, abrir a janela, prestar atenção no trânsito, ver a paisagem, levantar, sair. No conjunto, as ações, tarefas, operações e motivações específicas se somam, condicionadas pela motivação geral.

Atividades simples, como “imprimir um texto”, podem ser constituídas de poucas tarefas. Já outras, como “aprender a tocar piano” podem demorar anos e exigir uma infinidade de pequenas outras tarefas.

Mas o que é uma atividade e uma tarefa quando se quer preparar um bolo? Para realizar a atividade de fazer um bolo, pode ser preciso realizar ações como consultar uma receita e comprar ingredientes, e também tarefas como manipular ingredientes com colheres, selecionar tijelas, batedeiras, fornos…Independentemente de serem atividades ou tarefas, o importante é que sua realização pode ser intermediada ou ajudada por um produto resultante de design.

Origens

O design centrado na atividade tem origem na teoria da atividade, que começou a ser desenvolvida na primeira metade do século 20 e foi aprofundada pelo semiótico e psicólogo Lev Semenovich Vygotsky (1962). Vygotsky questionava a separação artifical entre mente e comportamento, mente e sociedade, e dava importância especial aos dispositivos mediadores, ou ferramentas, no desenvolvimento da mente e do pensamento, na criação de sentido através da ação e na ligação entre indivíduo e sociedade. (1, PDF)

Posteriormente, seu discípulo Alexei N. Leont’ev (1981) criou uma estrutura formal para operacionalizar o sistema de atividades através da identificação e exploração de múltiplos fatores contextuais.

De maneira geral, a teoria da atividade examina a criação de ferramentas para a exteriorização de processos mentais. Assim, os processos de tomada de decisão e a vida interior das pessoas têm menos importância que o que as pessoas fazem e as ferramentas que criam coletivamente, tanto para fazer coisas quanto para se comunicar.

Esta teoria se traduz diretamente na criação de objetos, artefatos e ferramentas em que as atividades dos usuários, e não seus processos subjetivos individuais, orientam o processo de design. Muitos produtos que usamos foram criados com base neste enfoque, como programas para ediçao de textos e imagens, as funcionalidades de carros e aparelhos eletrodomésticos.

Situações

Pode-se optar pelo modelo de design centrado na atividade quando:

O número de usuários de um artefato é muito grande, de contextos geográficos, culturais, sociais heterogêneos. Neste caso, é imposssível satisfazer aspirações individualizadas. Exemplos: caixas eletrônicos, estacionamento de shopping centers, canetas esferográficas, formulários online.

A atividade a realizar não envolve processos subjetivos ou de subjetivação intensos, ou não leva em conta a relação pessoal do usuário com o objeto. Exemplos: uso de torradeiras elétricas, programa para pagamento de imposto de renda, escovas de dente.

O processo de subjetivação pode ser separado do uso ou da manipulação. Exemplos: tocar piano (a maestria do pianista não está apenas na eficiência com que manipula as teclas), escrever um texto, criar foto com o celular.

Do mesmo modo como o design centrado no usuário, o design centrado na atividade também se baseia em pesquisas, como a catalogação de tarefas a realizar, a proposição de tarefas intermediárias, o estudo de produtos com a mesma função, o exame de tipologias de ferramentas convencionadas para a mesma tarefa. Estas pesquisas são mais focadas no comportamento dos usuários do que nas suas metas e motivações mais amplas.

Design centrado na atividade x design centrado no usuário

O professor e empresário Donald Norman (2) defende o design centrado na atividade, apontando fraquezas do design centrado no usuário, como:

O design entrado no usuário se baseia em um alvo em movimento. Se o perfil do/a usuário/a muda (e na verdade está sempre mudando), o produto que funciona para ele/a hoje não servirá mais amanhã. Deve-se considerar também as diferenças que os produtos apresentam para iniciantes e experts (como atender os dois grupos?), bem como os usos inventados pelos usuários (cada usuário usa um aplicativo de maneira diferente, como atender a todos?).

O foco nas pessoas pode levar à falta de atenção nas atividades em si, fazendo com que estas fiquem menos eficientes.

O produto centrado no usuário pode ter pouco sentido de coesão em relação às atividades a realizar e excessiva complexidade. Muitos se mostram eficientes de maneira estática, mas falham em atividades sequenciadas, como encontramos em alguns aplicativos.

Dificuldade de, a partir de personas, objetivar uma tecnologia a aplicar. Será que saber que uma persona com 37 anos, mãe solteira, que estuda para o MBA à noite pode condicionar o design de um produto ou de uma sequência de ações?

De qualquer modo, também o design centrado nas atividades dos usuários pode ser redutor, caso aplicado de maneira rígida, pois se o usuário (a partir de processos subjetivos) realiza ações não previstas, pode obter mensagens de erro ou resultados indesejados.

E se o contexto de uso for muito mais amplo que a atividade a realizar, o foco na atividade pode resultar na perda da visão do conjunto (é preciso desenhar um álbum de fotos ou projetar uma ferramenta para catalogar fotos por assuntos e compartilhá-las com amigos?)

Além disso, algumas ações podem ter conotações culturais diferentes. O que é melhor, simplificar uma compra online ou adicionar várias etapas de interlocução durante o fechamento da compra? – em alguns lugares, é de bom tom insistir para que o convidado coma uma comida, este comportamento pode se repetir em ambientes online?

Talvez a melhor alternativa seja considerar as vantagens de cada modelo e aplicá-los caso a caso, de acordo com os objetivos do projeto. Ou, no mesmo projeto, valorizar a experiência do usuário nas áreas editoriais e comerciais relacionadas ao contato interpessoal e valorizar as atividades em áreas em que é preciso realizar pagamentos, publicar conteúdo ou fazer uploads de fotos. Assim, pode-se priorizar sempre os objetivos de cada interação, e atender as necessidades específicas de cada problema.

(Publicado em 2.10.11. Atualizado em 12.4.2013)

Referências

1) Activity theory and context-based design – an ecological approach to designing smart tools and usable systems, PDF, Geri Gay e Helene Hembrooke (MIT Press, acesso em 1.10.2011)

2) Human-centered design considered harmful, Donald Norman (JND, acesso em 1.10.2011)

Livro: Designing for interaction – Creating innovative applications and devices, de Dan Saffer. Berkeley: New Riders, 2010

Livro: Prioritizing web usability, Jakob Nielsen e Hoa Loranger. New York: New Riders, 2006

Livro: Designing interfaces – Patterns for effective interaction design, Jenifer Tidwell. OáReilly, 2005