O conjunto de informações e conceitos coletados durante o planejamento e a pesquisa de um projeto de mídias digitais não é suficiente para garantir bons produtos. Antes de começar a detalhar as funcionalidades e o design, é preciso examinar os aspectos contextuais que condicionam o próprio processo criativo.

Muitas vezes o planejamento conceitual tem uma abordagem demasiado genérica do projeto e do produto a ser criado. Não detalha como o ambiente e as condições de produção podem influenciar a realização e diferenciá-los de outros produtos, tanto para os usuários quanto para as organizações que os produzem.

Aspectos concretos da realização revelam que nem sempre os produtos concebidos podem ser produzidos e finalizados da maneira como foram idealizados na definição do escopo e nas pesquisas de mercado. Por isto, os stakeholders precisam ficar atentos aos condicionantes (nem sempre limitadores) que entre a ideia e a produção. Alguns são verdadeiros desafios a considerar no dia a dia de projeto.

Apresentamos a seguir alguns condicionantes que influenciam os processos de criação e desenvolvimento de produtos online.

Demanda e experiência dos usuários, que constituem o principal motivo para a criação do produto e influenciam diretamente os objetivos de negócios. Os usuários têm demandas e experiências de caráter geral, como soluções de conexão, usabilidade, acessibilidade. E demandas específicas, sobre as funcionalidades de cada produto, como a realização de pagamentos, a transmissão de eventos em tempo real, a verificação da localização geográfica do usuário.

Nessa fase de descoberta dos usuários, a equipe mantém a mente aberta, busca novos pontos de vista, sem ser necessário ter uma imagem muito clara do produto. A observação empírica facilita a verificação de oportunidades ainda não pensadas, não articuladas. Ponto de partida dos demais condicionantes, a observação das demandas dos usuários estimula a criação de uma cultura interna centrada em sua priorização e seu atendimento durante e depois do projeto, acima de outros requisitos do produto.

Objetivos de negócios. Mesmo em empresas ou projetos que não tenham fins lucrativos explícitos, os objetivos de negócios se confundem com a realização dos objetivos do que o produto propõe ao público. Para verificá-los, é preciso manter seu monitoramento durante o projeto – até para ver se os objetivos mudaram –, bem como estabelecer métricas e modos de aferição do produto durante sua vida útil. (ver Objetivos do projeto)

Modo de gestão de projetos. Há casos em que um projeto inclui equipes heterogêneas, de departamentos e empresas diferentes, que aplicam diferentes dinâmicas projetuais. Como conciliar equipes que aplicam Scrum com equipes que usam o modelo em cascata?

É importante chegar a um ponto de acordo para que questões como estas não virem problemas no encadeamento de processos durante a realização das tarefas.

Recursos financeiros. O volume de recursos mobilizados afeta não só o projeto e o produto como seu lançamento, sua manutenção, sua evolução. Um produto online não pode ser bem sucedido se não puder ser mantido, atualizado, e evoluir no dia a dia. Os recursos financeiros influenciam também a maioria dos outros condicionantes, como pessoas, tecnologias, equipamentos, processos e tempo de realização. (ver Orçamento do projeto web)

Tempo. Como os recursos financeiros, não é um condicionante específico de produtos online, mas não pode ser ignorado. Quanto tempo é necessário para realizar a arquitetura da informação? O layout, o desenvolvimento, os testes? Há uma data específica para o lançamento? Se há, como ajustar a produção a esta data?

De modo geral, pode-se estimar o tempo com base em outros projetos da mesma naturezza. Mas é importante também considerar os recursos mobilizados e os processos necessários. (ver Cronograma)

Processos internos. Em diversas empresas, em uma empresa, em um departamento, os processos internos influenciam o desenvolvimento de novos produtos. Se mais horizontais e participativos, estes processos podem exigir ferramentas de acompanhamento de fluxo e comunicação compartilhadas, diferentes das utilizadas em ambientes com relações mais verticais.

Se o desenvolvimento técnico for realizado por empresa terceirizada, é preciso examinar como é o relacionamento entre as equipes e os processos de tomada de decisões.

Tecnologia e ferramentas. As plataformas de desenvolvimento disponíveis influenciam a solução de gerenciamento de conteúdo, bancos de dados, transmissão de vídeo em tempo real, uso de animações em aplicativos móveis, participação dos usuários. Às vezes o uso de uma delas é necessário, mas não há recursos suficientes. O que fazer? Há um substituto que possa ser usado? Por quanto tempo? Qual é o preço?

É importante também verificar os aplicativos necessários à criação e ao desenvolvimento. As plataformas são compatíveis? Estão em nuvem ou exigem instalações locais? Permitem o compartilhamento de arquivos e a realização de processos conjuntos e encadeados?

As ferramentas influenciam o relacionamento das equipes e sua seleção deve ser compatível com os ambientes técnicos das partes envolvidas e, naturalmente, dos usuários – não deve ser usada uma linguagem de programação de uso restrito a uma plataforma, por exemplo.

Informações disponíveis. Nem sempre uma avalanche de informações sobre um produto a desenvolver ajuda sua criação. As informações precisam ser filtradas, analizadas, editadas e apresentadas de modo inteligível, para ser realmente úteis.

É comum vermos conjuntos de links em pesquisas de produtos. Mas estes não têm qualquer aplicação se não forem previamente investigados e sua informação extraída de modo a ter valor específico para a situação em questão.

Equipes. As equipes e sua formação condicionam as características e o desenvolvimento dos produtos online. Seus critérios, modelos de tomada de decisão e sua cultura interna definem o resultado, independentemente do preparo técnico e da familiaridade com produtos online dos integrantes.

Algumas organizações, por exemplo, são amplamente favoráveis ao uso de redes sociais no ambiente de trabalho, outras são mais reativas. Este fator pode influenciar diretamente sua adoção, por exemplo, para interlocução com o público interno. (ver Gestão de equipes – projetos web)

Cada pessoa. A formação, o temperamento, a inserção de cada integrante da equipe de projeto também condicionam o produto final. Tão importante quanto a percepção coletiva entre pares, é a autopercepção de cada um e sua consciência do papel a desempenhar. Em momentos de crise ou dificuldade, a motivação pessoal pode salvar um projeto.

Infelizmente um projeto está mais sujeito aos seus condicionantes do que normalmente os stakeholders estão dispostos a reconhecer. É importante reconhecê-los, procurar dimensionar seu papel e estabelecer estratégias para lidar com eles.

Estas estratégias podem ser registradas na planilha de planejamento do projeto e ser atualizadas durante sua realização. Constituem um modelo resumido para o registro da realização de projetos de mesma natureza e podem ser muito úteis para evitar, no futuro, a repetição de erros e dificuldades.

(Atualizado em 6.8.2014)

 

Referências

Preventing the executive swoop and poop with design sprints, Jared Spool (User Interface Engeneering, acesso em 10.1.2016)

Introduction to Design Studio methodology de Jared M. Spool (User Interface Engeneering, acesso em 6.8.2014)

Livro: Designing for interaction – creating innovative aplications and devices, de Dan Saffer. Berkeley, CA: New Riders, 2010