O campo das análises de dados comerciais já foi considerado distante das ações diretas de negócios das organizações. Na última década, porém, novas técnicas, fontes e metodologias de análise trouxeram maior rigor e apoio a decisões. Algumas ações relacionadas à coleta e interpretação de dados gerados a partir de produtos digitais:

Definir os objetivos da análise dos dados de acesso do site, plataforma, aplicativo, página em mídia social, para que se relacionem aos objetivos estratégicos (comerciais, sociais ou editoriais) do contexto e da organização.

Canais digitais de varejo precisam aumentar continuamente as vendas de produtos; canais de notícias procuram atualizar e entreter seus leitores e espectadores em tempo real; plataformas sociais catalizam relacionamentos. Cada canal online tem objetivos e metas diferentes, a razão da sua publicação.

Definir os usuários prioritários e os canais de acesso, que podem mudar com o tempo. Incluem visitantes novos, visitantes à procura de produtos ou informações, consumidores, afiliados, colaboradores internos. Cada grupo tem seus comportamento e expectativas.

Segmentos podem também ser definidos pela origem do tráfego: usuários que chegam a partir de mídias sociais, de malas diretas, buscas patrocinadas ou orgânicas, links em outros canais. Esses acessos podem ser rastreados a partir de linhas de código nos próprios links.

Desenvolver e aplicar metodologia de coleta de dados, baseada em indicadores-chave (KPI, Key Performance Indicators) que filtrem os dados disponíveis e mostrem se o canal digital alcança seus objetivos. Estabelecer os parâmetros de análise.

Jakob Nielsen simplificava a fórmula de sucesso de um site web, por exemplo:

B = V × C × L

B indica os negócios realizados por meio do canal (ou metas alcançadas);
V indica os visitantes únicos;
C é a taxa de conversão (visitantes que se tornam clientes);
L é a taxa de lealdade dos clientes, ou o número de vezes que retornam para realizar transações. (Usability ROI declining, but still strong, 22.1.2008).

É importante integrar o monitoramento de acessos com os custos de manutenção e divulgação, para calcular o custo de cada clique.

Considerar também as ações dos usuários em cada canal:

◊ Em canais de comércio, acompanha-se o percurso do consumidor desde a motivação do acesso até a compra e pós-compra, para examinar a taxa de abandono do carrinho de compras e a satisfação com a experiência de uso. Ferramentas como o Maestro, da Predicta, ajudam nessa tarefa.

◊ Em canais de notícias ou de publicação de conteúdo, pode-se acompanhar o número de visitas, visitantes únicos, cadastrados em malas direta ou de acompanhantes no Twitter, Facebook.

◊ O acompanhamento dos acessos via contatos no Twitter, Facebook e links em outras mídias sociais provê a medida do grau de uso desses canais na comunicação institucional. Para isto, criar indicadores no acompanhamento de acesso e rastrear os acessos vindos a partir de campanhas de marketing. Pode-se também criar segmentos que definam dados das estatísticas, como os acessos com origem nas principais mídias sociais.

O impacto comercial dessas mídias, no entanto, é difícil de avaliar. Uma pessoa pode ver um anúncio ou mensagem em um deles e não realizar uma ação imediata. Pode deixar para buscar o produto depois, e até comprá-lo, depois de várias visitas ao site ou aplicativo. Nesse caso, a mídia social não tem participação direta na venda, mas atua na conversão. Pode-se acompanhar a origem dos acessos e verificar as mídias sociais mais efetivas.

Já em uma campanha de marca que use mídias sociais, o grau de participação dos seguidores por meio de mensagens, respostas, “curtidas”, pode ser medido, e demonstra mais envolvimento direto com a marca do que seguidores (que podem ser obtidos de maneiras artificiais).

No entanto, a consideração das estatísticas deve ser relativizada. Nos dados de acesso de visualizações e ações de livestreams em redes sociais, por exemplo, o que se mede mais é a aceitação, a raiva, o apoio e a tristeza de 3% que sentiram necessidade de se pronunciar. Os 97% que escolheram não reagir talvez tenham ficado em dúvida sobre o que viram/assistiram, ou não o tenham valorizado o suficiente para reagir, ou quisessem pensar mais um pouco. Não se pode saber o que as pessoas sentiram apenas com a escolha de 6 botões de julgamento e uma caixa de comentários. Mede-se mais o que os “barulhentos” avaliam. (2)

A metodologia pode se basear inicialmente em soluções baratas e fáceis de implementar. À medida que o valor das análises no negócio ficar mais claro, podem ser necessários investimentos adicionais na infra-estrutura e na qualidade dos dados.

Coletar os dados, no servidor ou em outros canais e pontos de contato com os usuários. Pode-se fazer a coleta de dados por meio de web logs no servidor ou com o uso de Javascript nas páginas, por exemplo.

Nenhum resultado desses dados é totalmente preciso, devido a erros de DNS e JavaScript. A margem de erro fica em torno de 10% dos registros. Se os pacotes se mostrarem insatisfatórios, contrate mais de um. Dois ou mais pacotes de análise atuam para estabelecer referências mais precisas e a partir da média combinada de registros. Pode-se também estabelecer processos de contabilização dos dados de acesso via servidor web.

Por meio da implementação inteligente de abordagens de aprendizado de máquinas e da complementação dos dados internos com fontes externas (pesquisas de opinião, testes de usabilidade), é possível extrair informações úteis. Pode-se ainda melhorar a avaliação ao longo do tempo, com maior investimento em infra-estrutura e qualidade de dados.

Dependendo dos objetivos de negócios, pode-se coletar também informações no Google AdWords, Bing/Yahoo, Facebook, Twitter, campanhas de email marketing.

A coleta de dados deve incluir não só os dados de acessos, mas também o monitoramento dos dados gerados em mídias sociais e aplicativos para dispositivos móveis, caso haja estratégias organizacionais nesse sentido.

Consultar dados da web brasileira ou mundial, como Browser News, ou estatísticas de áreas de atividade para comparar o uso de browsers, configurações de hardware, como resolução do monitor. Pode-se assim verificar as características técnicas dos usuários, por exemplo.

Realizar testes com usuários, com perguntas a usuários reais sobre o canal. As respostas podem influenciar a estrutura de informações, o conteúdo, os mostruários de produtos, ou os processos de avaliação. Pontos críticos e aperfeiçoamentos podem ser vistos a partir do ponto de vista de terceiros, que trazem para a equipe de projeto/manutenção evolutiva o olhar de fora, que renova as perspectivas dos olhares “de dentro” do produto.

Integrar os dados obtidos. Os dados das empresas que se baseiam em comportamentos dos usuários são muitas vezes coletados, armazenados e usados em departamentos diferentes (como linhas ou canais de produtos). A centralização dos dados cria uma visão abrangente para que todos estabeleçam consenso e aperfeiçoem os pontos fracos. Essa visão se baseia na combinação de dados estruturados (como cobrança e processamento de pedidos), coletados nos processos operacionais visíveis ou não ao cliente, e dados não estruturados (gerados em mídias sociais, por localização, imagens, fala, etc.). Inclui não só a coleta e a classificação dos dados, como a facilitação do acesso pelos usuários corporativos, para que avancem para além das medidas básicas (como taxas de rejeição, conversão) e resolvam problemas comerciais mais complexos, como “por que as taxas de abandono do carrinho caíram com a nova campanha por mala direta?”

Em um grande fabricante de automóveis, vários grupos internos possuíam seus próprios repositórios de dados e não os compartilhavam. A equipe de marketing decidiu então investir em um banco de dados unificado sobre clientes, para que o compartilhamento de dados efetivamente acontecesse, e precisou comunicar insistentemente as recompensas e os benefícios do sistema para toda a empresa, descrevendo as vantagens para o aumento de eficiência de cada silo interno. (3)

A pesquisa The Power of Omnichannel, divulgada pela Criteo em dezembro de 2017, mostrou que 46% dos compradores do Reino Unido disseram que recebiam uma experiência de compras inconsistente dos varejistas quando faziam compras em vários canais. 50% dos consumidores afirmaram que os varejistas deveriam arquivar suas informações para enviar ofertas personalizadas, enquanto 38% gostariam que eles as usassem oferecer experiências como opções de entrega automatizada e registros de modos de pagamento preferenciais. No entanto, 18% dos compradores não quiseram que os revendedores armazenassem qualquer informação sobre eles, o que representou um obstáculo para o cruzamento de dados pelos varejistas que desejavam integrar o serviço de atendimento em todo o espectro de pontos de contato do consumidor.

Os varejistas mostraram que entendiam a importância de conectar os canais veiculados: 72% relataram que buscavam ativamente, como prioridade comercial, uma estratégia de dados cruzados. Para permanecer relevantes, deveriam abandonar as estratégias ortodoxas e alavancar os dados para oferecer uma verdadeira experiência de omnichannel personalizada. (4)

Integrar os dados digitais com os de pesquisas qualitativas, como pesquisas etnográficas, por exemplo, para valorizar o design centrado no usuário. Isso exige tempo, para examinar como os clientes fazem suas escolhas em diversos contextos, e para observar seus comportamentos e compreender nuances de diferentes segmentos e suas motivações. A partir dos detalhes coletados nessas pesquisas, os designers podem desenvolver e aperfeiçoar personas e cenários de uso, e converter esse conhecimento em melhoras dos produtos.
As pesquisas qualitativas precisam ser cada vez mais freqüentes, uma vez que as tecnologias digitais estão sempre mudando os hábitos e as percepções dos clientes. À medida que as empresas aumentam a amplitude e a profundidade desses conhecimentos, entendem como se alinham aos dados dos repositórios digitais e com sua estratégia de negócios.

A integração de dados qualitativos e quantitativos permite o equilíbrio do marketing direto (que comunica os recursos e valores de uma marca), com narrativas e interlocuções mais emocionais, profundas e duradouras. A integração e a consistência das mensagens podem ajudar a corrigir erros na jornada do cliente, bem como aumentar as taxas de conversão. (3)

Analisar os dados coletados de acordo com a metodologia estabelecida, aplicando os resultados em mudanças e melhorias nos processos internos, no conteúdo, arquitetura de informação, etc.

As análises começam por dados gerais, como o número total de visitas, a taxa de rejeição, as páginas visitadas, o conteúdo das páginas mais visitadas, o tempo médio de cada usuário no canal, o percentual de novas visitas.

E avaliam a origem do tráfego, em percentuais ou números absolutos de visitantes, seja os que acessaram aplicativos dedicados, digitaram diretamente URLs no browser, chegaram por meio de ferramentas de busca.

Outro dado importante é a taxa de rejeição (bounce rate), especialmente das páginas/telas mais acessadas, que mede o número de visitas de apenas uma página/tela e pode apontar para um canal que retenha pouco o público. Se for o caso, integrar à análise do canal online principal as estatísticas de acesso de aplicativos, subsites e outros sistemas.

Em mídias sociais, fatores como envolvimento (criação de conteúdo compartilhável em círculos de relacionamento), defesa da marca (retweets por seguidores fiéis, por exemplo) e retenção (seguidores que se mantêm estáveis) são mensuráveis a partir da participação do público. (1)

Em todos os casos, os dados devem ficar alinhados aos objetivos comerciais dos canais de contato com o cliente, bem como às suas oscilações e mudanças.

Criar um modelo de relatório com os dados de maior importância estratégica relativa aos objetivos de cada canal, para ajudar os gestores a tomar decisões. Um formato de relatório fácil e rápido de visualizar, sem jargões técnicos, com informações relevantes e indicações claras do que é preciso fazer para melhorar os resultados facilita a leitura e a tomada de decisões sobre os ajustes necessários.

Em empresas grandes e com diversas camadas de gestão, pode-se criar relatórios para leitores em diferentes níveis. Nesse caso, as gerências acessam informações sobre como os canais digitais alcançam seus resultados; as gerências médias priorizam informações sobre os resultados de campanhas (publicitárias, de marketing) e ações de otimização; e a equipe técnica atua sobre os dados do desempenho do canal.

A avaliação é permanente. Pode-se escolher indicadores diferentes para análises mais detalhadas, semanais e mensais. A verificação regular dos dados permite que se estabeleça as melhores cadências para cada um.

Treinar as equipes (gerentes de produto, designers, arquitetos de informações, analistas de dados, editores, equipe de marketing e vendas) para a análise das informações. Esses são também responsáveis pelo monitoramento das mudanças nos produtos e no negócio a partir dos relatórios e seus resultados.

Em empresas em que as plataformas online influenciam o negócio, todos os colaboradores são envolvidos direta ou indiretamente na apuração dos dados, na observação dos usuários e nas alterações nos produtos e no negócio em tempo real. A responsabilidade pelas ações a partir das análises é compartilhada e aplicada para o aumento do retorno, a diminuição de custos e o aproveitamento de oportunidades.

“Quando se trata de métricas, a análise deve ter uma função independente e ser uma fonte de verdade para a equipe”, diz Neil Hiltz, diretor de serviços financeiros globais para o Facebook. “Esse grupo deve monitorar o desempenho, trabalhar com parceiros multifuncionais para melhorar o desempenho e melhorar continuamente o sistema que mede a experiência do cliente” (3)

Estabelecer as mudanças (em processos, funcionalidades, estrutura, layout, técnicas) a partir das análises. Como nem sempre os responsáveis pelas análises são os responsáveis pelas ações e mudanças a partir das análise, é preciso que as mudanças estejam incorporadas ao dia-a-dia operacional, para melhorar continuamente o produto.

Prever tendências a partir das análises. O conhecimento ao longo do tempo permite que os especialistas prevejam tendências não só relativas a um canal online específico como também ao ambiente comercial em que estão inseridos, em suas variações geográficas, culturais, sazonais.

(Atualizado em 24.12.2017)

 

Referências

4) Retailers face cross-channel challenge amidst rising demand of personalised shopping experience, Sasha Fedorenko (Internet Retailing acesso em 25.12.2017)

3) Five questions brands need to answer to be customer first in the digital age, Prashant Gandhi, Jonathan Gordon, Jesko Perrey, e Sofia Serra (McKinsey, acesso em 24.12.2017)

2) Previsões para o jornalismo em 2018: livrando-se da tirania dos barulhentos, Lam Thuy Vo (Poder 360, acesso em 24.12.2017)

Unlocking the power of data in sales, Charles Atkins, Maria Valdivieso de Uster, Mitra Mahdavian, Lareina Yee (McKinsey, acesso em 21.4.2017)

Want to control your fate? Own your measurement plan, Uri Bar-Joseph (Search Engine Watch, acesso em 26.8.2014)

7 Things your company gets wrong about user research (Wired, acesso em 29.6.2014)

1) Making the most of social media analytics (ReadWriteWeb, acesso em 7.6.2012, não mais publicado)

Measuring social media with web analytics, Part 2, Nathan Linnell (SearchEngineWatch, acesso em 5.4.2010)

Otimizador de website do Google – ferramenta que permite a designers e gestores testar o acesso a variações de páginas web com o mesmo endereço e ver as que geram maior número de conversões

 

Curso gratuito

Data analysis for social scientists (MIT, gratuito, em inglês) – métodos para responder questões de interesse diversificado (culturais, sociais, econômicas, políticas) com base na análise de dados.